sábado, 18 de abril de 2009

Encontros necessários à compreensão do mundo


Certa vez, ainda calouro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, caminhava juntamente com colegas de classe pelos corredores do famigerado “setor V”. Naquela manhã, nuvens esparsas e um céu azul clarinho tomavam conta dos meus olhos. Os pés de azeitona, roxas e adocicadas ao alcance das mãos, balançavam vagarosamente como que ainda acordassem do breu da noite que se passou.

No meio de uma conversa informal, levantei a vista. Os olhos, antes atentados pelas cores vivas do dia, agora esmoreciam por confrontar-se com aquela figura que aparecera repentinamente. Rugas, pele morena, cabelos grisalhos, uma baixa estatura. Demonstrava cansaço pela idade, mas mesmo assim carregava pesadas sacolas à mão e estava ali, lutando sozinha àquela hora da manhã.

Senti-me tocado sem ao menos trocarmos olhares ou palavras. A distância entre os meus passos e os seus foi diminuindo. Vinha, agora, em minha direção. Olhou-me como se os outros não estivessem ali e falou mais ou menos assim:

- Filho. Já tenho certa idade, mas tenho que pedir. Bato de porta em porta por aqui, pedindo e me humilhando. Alguns professores autorizam que os alunos ajudem, outros não. Você poderia me ajudar?

A minha voz não quis mais sair, os olhos encheram-se de lágrimas, o coração se esvairia numa mistura de ódio e compaixão. Ódio pela desigualdade ali exposta, compaixão pela figura humana. Segurei as lágrimas e respondi com dificuldades que não tinha como ajudá-la naquele momento, pois não possuía absolutamente nada de valor. Olhou-me, agradeceu, seguiu o seu caminho.

Segurei o choro até ela sair da minha vista, após isso não resisti. Chorei sozinho por uns cinco minutos sem ao menos saber o porquê, mas chorei feito criança. Talvez pelo sentimento de incapacidade, talvez pela exclusão que nós mesmos proporcionamos. Nunca esquecerei daquele breve encontro, eu só tinha dezessete anos.